Ensaio sobre o Ensaio Sobre a Cegueira
Podia ser um filme do Shaymalalan (designação carinhosa) mas, pelo menos, melhor que o “Acontecimento”. Cenários apocalípticos e metáforas, metáforas, metáforas. Gosto de metáforas. Noutro dia, a Meg e eu metaforizamos a ida para o lixo de uma carteira velha e a aquisição de uma carteira nova com grande sucesso (caso não te recordes, lembro-te que primeiro tens de comprar a carteira nova e depois quase não custa mandar fora a velha).
Voltando ao filme. Imaginando-me na posição da mulher do médico (Julianne Moore) – a única que vê, numa multidão de cegos encurralados - fui muito rápida a desejar-me tão cega quanto os outros todos. A degradação daquela comunidade forçada era bastante atenuada pelo facto de não (se) verem. E embora a cegueira contagiosa fosse a razão para estarem presos e abandonados, de quarentena, não é sugerido outro motivo para o total descalabro da organização social que não resulte da (maléfica) natureza humana. O tal de Saramago será de esquerda?
Por último, há umas cenas chocantes que eu dispensava mas o Meirelles ou mesmo o Shaymalalan não dispensam. E há também os santos nos altares com os olhos vendados, em mais uma metáfora, para mim incompreensível. Imagino que para o autor de “O Factor Deus” não exista cegueira maior do que a fé religiosa e, mesmo assim, continuo sem arranjar explicação para os santos de olhos vendados. Talvez lendo o livro ou indo comer qualquer coisa que já está na hora do almoço.