Dia de eclipse
Primeiro, o choro de uma menina de uns quatro ou cinco anos. Uma voz de homem saía com dificuldade, como se rangesse os dentes enquanto falava, mas não se dirigia à criança: “nunca... mais... digas... essa palavra”, “sai da minha frente”, “larga-me”.
Por esta altura percebo que isto não faz parte do meu sonho. Está a passar-se no patamar da escada do prédio, a três ou quatro metros da minha cama. A mulher emitia uns gritos entrecortados, parecia teatralizar o efeito de ser afastada do caminho pelo marido. Mais acima, provavelmente apenas com a cabeça de fora da porta de casa, uma voz de rapaz adolescente chamava: “Pai? Pai?”.
O homem, quase no fim das escadas, insiste: “sai da minha frente, larga-me”, até que a porta do prédio se fecha com estrondo. A criança pára de chorar. Instala-se o silêncio. Ouvem-se uns passos de regresso ao andar de cima.
Eu hoje acordei assim©, angustiada com o drama alheio como se fosse o meu.
1 Comments:
Isso é que foi.. Qu´aflição.
Enviar um comentário
<< Home