Para mais tarde recordar (2)
Conhecia uma pessoa que implicava com a quantidade de fotografias que eu tirava e, mais tarde, com o facto de andar também de máquina de filmar para trás e para diante. Dizia que mais valia olhar com tempo e dedicar à observação toda a atenção que dava ao registo fotográfico e fílmico. Ele tinha alguma razão e eu tenho algumas explicações.
Por exemplo, preciso de provas que demonstrem que estive ali e vi aquilo e que já fui mais magra (e mais gorda, é verdade). Por outro lado, há momentos em que o entusiasmo se transforma em ansiedade e fico convencida que ilha de Capri vai desaparecer inteirinha dali por meia hora, ou pelo menos aquela luminosidade específica, o que é igual. E, é claro, o grande argumento de que as palavras não chegam para descrever aquilo que vemos (de regresso, descubro que as fotografias e o filme também não fazem plena justiça, servem como sucedâneo ou como forma de reavivar o que só foi registado pelos olhos). Por fim, há que dar a devida relevância ao factor do costume. A minha mãe sempre distribuiu entre nós o fardo de acartar com o equipamento: tu levas a grande angular, a tua irmã tem a teleobjectiva, eu fico com a de filmar; tenho de comprar uma máquina mais leve. Lembro-me de reclamar bastante contra esta tirania das fotos e dos filmes, em especial quando era incumbida de filmar e ficava a ver as vistas por um canudo.
Ora, isto não veio a propósito das recordações fotográficas da Huma. Acontece que fui passar uns diazitos a Paris e esqueci-me do carregador da máquina fotográfica em casa. A depressão profunda durou dez minutos, um período de tempo cuja duração não poderá ser devidamente apreciada sem levar em conta que me encontrava à beira Sena, a caminhar na direcção da ponte que liga o Trocadero à Torre Eiffel, quando me apercebi da catástrofe. Depois, conformei-me a ter experimentar como seria isto de viajar e passear e ver, sem fotografar.
[tirei 9 fotos com a máquina digital e 37 com uma descartável, o que, como é óbvio, é o mesmo que nada]
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