Serendipity

The laws of chance, strange as it seems,
Take us exactly where we most likely need to be
[David Byrne]

quarta-feira, 10 de agosto de 2005

No funeral (2)

A música dos Rolling Stones é tocada, em órgão de igreja, no velório do Alex. A seguir, durante o cortejo, passa quase integralmente.

É irónico. A letra parece apelar ao conformismo de quem não tem tudo aquilo que quer. Um apelo que tanto me irrita como me parece acertado. Nesse sentido, condena a atitude do Alex por não se ter conformado. Devia contentar-se em ter aquilo que precisa - até para isso é necessário algum esforço e nada está garantido (if you try sometimes you find), mesmo que quisesse muito mais.

Mas a fantástica solução do Alex inconformado foi o suicido. E, afinal, ele teve exactamente aquilo que queria, sem ter tido aquilo que precisava. Ter o que se precisa pode ser bem mais difícil do que ter o que se quer.

[Para a Charlotte, à laia de justificação.]

8 Comments:

Blogger Charlotte said...

Ah! Irónico, pois estou a ver.

"Ter o que se precisa pode ser bem mais difícil do que ter o que se quer." Pode, pode, mas parece-me um bocado tonto. Se não precisavamos antes de querer, passámos a precisar por querermos. Tenho alguma dificuldade em perceber a diferença entre "precisar" e "querer". (pausa) Podemos precisar de alguma coisa sem de facto a queremos, mas o inverso não me parece possível. No meio disto tudo, é provável que esteja enganada. Mais exemplos?

7:13 da tarde  
Blogger Sam said...

Também embiquei um bocado com a distinção entre os dois termos por achar que se quero é porque preciso.
De facto, é mais fácil encontrar coisas que precisamos mas não queremos (uma ida ao dentista) do que o inverso. O melhor exemplo do inverso é o do Alex: ele quis morrer mas não precisava de.
A dificuldade está no facto de o “querer” ser sempre subjectivo e “precisar” implicar algum esforço para ser um bocadinho mais objectivo.
Voltando à carga: nalguns aspectos é mais fácil satisfazer os nossos desejos do que as nossas necessidades.

8:03 da tarde  
Blogger Charlotte said...

Parece-me certo que "nalguns aspectos [seja] mais fácil satisfazer os nossos desejos do que as nossas necessidades". Precisar de ir ao dentista não é (de maneira nenhuma) querer ir ao dentista. Mas querer ir ao dentista, não será também, afinal, precisar de o fazer? Posso querer ir ao dentista porque:

1. prefiro prevenir do que remediar e quero ir ao dentista de três em três meses, só para ver; ou
2. sou completamente obcecada com a minha higiene oral.

Em ambos os casos, "querer" é, na verdade, "precisar". Mesmo neste exemplo (chamemos-lhe prático), não consigo separar a necessidade do desejo; ou seja, o desejo implica uma necessidade. Parece-me seguro dizer que implica "sempre". Mas a necessidade não implica um desejo. Por isso me pareça um pouco tonto (desculpa a palavra, mas não consigo pensar noutra, ainda por cima com um exemplo que me desagrada tão profundamente como o do suicídio) estabelecer uma prioridade, por assim dizer, ao contrário. Pouco pode (ou deve? enfim, será outra discussão) ser mais fácil do que satisfazermos as nossas necessidades. Mas o pormenor "nalguns aspectos" engata isto tudo. Gostaria que fosse mais precisa. Em que aspectos estás a pensar?

9:25 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Minhas queridas:

Tenho-me esforçado, tendo até dado tempo ao tempo, a ver se com a passagem do mesmo o meu nivel de compreensão melhora, mas não consigo perceber. Por exemplo: a frase, o raciocinio "E, afinal, ele teve exactamente aquilo que queria, sem ter tido aquilo que precisava.", parecendo-me não obstante muito boa e inteligente, não a consigo compreender. Não dá. Por mais que me esforce, uma espessa cortina de nevoeiro separa-me de ver um milimetro que seja em profundidade.

O que o gajo quer, quer, um que um gajo necessita, necessita. Daqui não sou capaz de passar.

Mas está tudo muito bem, muito bem.

11:06 da manhã  
Blogger Sam said...

Uma pessoa está a tentar levar paulatinamente o cérebro to a complete stop, condições ideais para o começo de férias, e mete-se numa destas. Até porque há outras pessoas, pessoas que inclusivamente se chamam Charlotte, que teimam em ser consequentes nas impressões trocadas. Isto, repare-se, nesta altura do ano e numa caixa de comentários.

Deveria ser fácil satisfazermos as nossas necessidades, sim. Mas é realmente fácil? Acho que não. E, pondo os pontos nos is, estou a falar de necessidades emocionais. O primeiro problema é identificá-las e reconhecer que estão lá. Bom era conseguir fazê-lo antes de gastarmos uma fortuna em coisas que queremos tanto que achamos que é exactamente aquilo que precisamos, e outras tontices do género (estava a ver que não ia conseguir usar a palavra). Depois é preciso orientar as nossas prioridades de maneira a tratar primeiro dessas necessidades. Veja-se
um boneco
. Por fim, podemos já ter assumido as nossas necessidades e ter até estabelecido que é uma prioridade satisfazê-las, mas ainda assim não haver meio. Como dizia o outro, a nossa necessidade de consolo é impossível de satisfazer.

[a ti, meu querido, louvo-te a tua capacidade de apreciares devidamente a qualidade de um raciocínio que não compreendes. É um dom.]

11:58 da manhã  
Blogger Charlotte said...

Eu conheço este querido Anonymous de algum sítio... Mas enfim, um gajo é um gajo é um gajo.

Ah, necessidades emocionais! Muito me contas. Pois claro. O boneco é lindo, maravilhoso. Não precisa de explicações. Podemos racionalizar assim (como escreveste) as nossas necessidades emocionais? Saberemos exactamente reconhecer o que nos faz falta, de modo a estabelecer prioridades... emocionais? A frase "a nossa necessidade de consolo é impossível de satisfazer" parece-me um pesadelo insuportável! Só angústia, lamúrias, dores escusadas. Mas o consolo é uma coisa muito complicada. Acho.

Subitamente, "precisar" e "querer" perderam para "necessidades emocionais". Será justo?

E se pensas que vais de férias sem dar uma conclusão decente a isto, estás muito enganada. ;-)

10:23 da tarde  
Blogger Sam said...

Saberemos exactamente reconhecer o que nos faz falta, de modo a estabelecer prioridades... emocionais?

Muito de vez em quando temos uma ideia aproximada e esperamos não estar enganados.

Outra coisa que dá cabo das minhas teorias tão lindas é o uso abusivo da primeira pessoa do plural.

Se eu tivesse de dar uma conclusão decente a isto para ir de férias, estava desgraçada. Conheço a minha interlocutora.

2:27 da tarde  
Blogger dan said...

tá mal, sinceramente, este post já me pôs a postar de uma maneira que não é adequada à vontade.
eu não queria, e fiquei a precisar de postar, em vez de ter comentado logo aqui. entretanto já cortei um bocado da posta, que ficou mais curtinha e se refere a isto, a este post..

Boas Férias, mazé!

3:26 da tarde  

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